IRONMAN FRANKFURT 2009
IRONMAN FRANKFURT 2009
Por: Telmo Veloso
{xtypo_dropcap}E{/xtypo_dropcap}u, a Susana e o Nuno Barbosa participámos no passado dia 5 de Julho no Ironman de Frankfurt. No Porto Runners, até essa data, só o Pedro Lopes tinha conseguido concluir esta distância mítica (3,8kms natação – 180 kms bicicleta – 42,2 kms corrida). Nós íamos tentar repetir a façanha, sabendo que a tarefa que nos esperava era difícil e obrigava a muito sacrifício.
7 Julho 2008
Esta foi a verdadeira data em que começou o Ironman de Frankfurt. Sabendo que as quase 3.000 vagas se esgotavam em poucas horas, tínhamos de nos inscrever logo na abertura. Com alguma atenção às horas, lá conseguimos que os nossos nomes fossem incluídos na Start List.
A partir de então a nossa vida ficou condicionada pelos treinos, era necessário “meter” horas e todas as oportunidades tinham de ser aproveitadas. Lembro-me de no dia de Natal ter acordado às 6 horas para ir de bicicleta com a Susana até Armamar para almoçar com os meus pais (uh… quase congelámos). Férias na passagem de ano foram aproveitadas para andar de bicicleta no Alentejo e Algarve. Quase todos os Sábados e Domingos de manha foram passados em cima de uma bicicleta. Mini-férias da Páscoa também foram no Algarve a treinar o dia inteiro.
Aos poucos fomos aumentando a duração dos treinos, especialmente da bicicleta que era a modalidade que mais nos assustava. Andar mais de 80kms era, até então, um treino especial e muito pontual, a partir de certa altura passou a ser normal. 100, 120, 140kms passaram a fazer parte do nosso quotidiano e às vezes em dias repetidos…tinha de ser. A meio da preparação decidimos testar a nossa capacidade de sofrimento na corrida a pé e participámos nos Caminhos de Santiago (160kms em 3 dias) e na Ultra Geira Romana (45kms de montanha). Estas 2 provas deram-nos muita confiança e mostraram-nos que o nosso corpo é capaz de muito mais do que imaginamos. Chegámos também a fazer 200kms de bicicleta num só dia para testarmos a distância (pena foi ter estado sempre a chover).
A preparação foi continuando com muitos treinos e algumas provas pelo meio. A data foi-se aproximando e o nervosismo aumentando. Quando faltavam 17 dias quase que deitava tudo a perder. Caí de mota, fui parar ao hospital com uma ferida na perna direita e tive de parar com os treinos, especialmente de natação. Podia ter sido muito pior mas foi o suficiente para me abalar a moral.
VIAGEMNo dia 2 de Julho viajámos para a Alemanha e fomos de imediato levantar o dorsal. No dia seguinte mais um contratempo. Descubro, quando nos preparávamos para um passeio de bicicleta, que tinha empenado a pedaleira durante a viagem de avião. Na oficina oficial da prova não tinham pedaleiras iguais à minha e não me restou outra alternativa senão ir pela cidade procurar uma loja de bicicletas. Foi por pouco mas lá consegui resolver o problema (escusado será dizer que os nervos foram muitos).
No dia 4 de Julho (sábado) tivemos de fazer o check-in e colocar todo o material junto ao lago onde iria decorrer a natação (claro que ainda fomos dar umas braçadas).
IRONMAN - 5 Julho de 2009
4:00h - Pequeno-almoço no quarto
5:00h - Táxi à porta do Hotel
5:15h - Quase fomos expulsos do táxi pelo “talibã” que se enervou quando eu lhe disse que estávamos em sentido contrário ao pretendido.
5:45h - Chegámos ao lago.
6:30h - Vestimos os fatos e fomos para a água
7:00h Começou o Ironman!!!!
Os 3.800m de natação foram longos, tanto em esforço como em tempo. Com 2.800 atletas em prova tornou-se complicado nadar, especialmente no início. Depois de muito esforço e muita pancada, consegui sair da água com 1:09h. Não sabia mas o Nuno tinha saído uns segundos à minha frente e a Susana sairia 20 minutos depois.
Uff!!! A natação já estava ultrapassada. Tirei o fato, vesti uma camisola e uns calções de ciclismo e lá fui eu.
A sensação é estranha, começar a pedalar para fazer 180kms em prova. Eram 2 voltas num percurso relativamente plano, com 3 subidas por volta. Fui sendo ultrapassado por muitos atletas, mas também fui passando muitos outros. Todos íamos andando, cada um ao seu ritmo, porque ninguém pode andar a menos de 7 metros de outro atleta.
Nas subidas estava a parte mais emocionante de toda a prova. Todas as subidas estavam cheias de pessoas que, entusiasticamente, incentivavam todos os atletas, não faltando música, palmas e energia positiva! Na 3ª subida (a mais íngreme), os espectadores eram tantos que se tinham de afastar para nos dar passagem e depois vinham a correr ao nosso lado, tal e qual a Volta a França. Confesso que, especialmente durante a 1ª volta, as lágrimas vieram-me aos olhos várias vezes, e não foi por causa do esforço. O cansaço lá surgiu a meio da 2ª volta e com mais intensidade na última subida (a 10kms do fim).
Quando cheguei ao Parque de transição o tempo de bicicleta marcava 5:32h (média de 32,7kms/hora). Muito bom! Eu ia tentar fazer 6 horas na bicicleta e, com a emoção da prova, consegui menos 30 minutos.
O Parque de Transição para a corrida foi fantástico. Desmontei da bicicleta e alguém pegou nela e levou-a, continuei a correr e de repente estava alguém a correr ao meu lado com o meu saco de material para a corrida. Chegando a uma tenda, sentei-me e ajudaram-me a trocar de roupa e de sapatilhas. Poucos minutos depois estava pronto a correr com a camisola do Porto Runners vestida.
Só faltava a Maratona. Sempre pensei que a corrida seria das 3 modalidades a que menos me iria custar, mas não foi o caso…
Às 14 horas estavam cerca de 33 graus, muito calor para uma maratona e muito mais para quem já tinha 7 horas de prova. Seriam 4 voltas de 10,5kms num trajecto bonito sempre à beira do rio, mesmo no centro de Frankfurt. Para além da beleza do local, outra vez uma enchente de espectadores. Não havia um local sem público. Para além dos amigos e familiares dos atletas, a população de Frankfurt estava nas ruas a bater palmas e a fazer barulho.
Na primeira volta senti-me bem, mas na 2ª começou-me a faltar forças e durante a 3ª e a 4ª já só contava os kms que faltavam, tal era a fraqueza que sentia. Cada abastecimento (2 em 2 kms) era uma desculpa para parar. Entretanto recebia uma má notícia, o Nuno tinha desistido já na maratona, com uma dor numa perna. Ainda me custou mais chegar ao fim, mas só pensava que cada vez faltava menos. Talvez fosse cansaço, talvez fosse fome (comi muito pouco com medo de cólicas), talvez fosse o calor, não sei. Confesso que sofri.
Quando entrei na recta final as lágrimas voltaram a aparecer. No final da recta virava-se à direita para uma praça onde ficava a meta. Nessa praça montaram 2 bancadas para cerca de 2.000 pessoas. As bancadas estavam cheias, peguei na bandeira de Portugal e levantei-a bem alto, queria mostrar que Portugal estava presente (afinal éramos só 5 tugas no total).
Cruzei a meta, colocaram-me a medalha…. já era um IRONMAN!!!!3h:51m na Maratona e 10:40h no total. Estava feito!
Na véspera, uma brasileira tinha-nos dito que o que custa são os treinos, a prova em si passa muito rapidamente. Achamos que era um exagero, mas não o era…a prova passou num ápice. Ainda me custa a acreditar que estive mais de 10 horas em prova, parece muito tempo mas não se sente.
Depois da meta o cenário era semelhante a um hospital de guerra. Perguntaram-me se precisava de assistência médica, não era o caso. Junto à meta havia 3 tendas gigantes só com marquesas com atletas deitados a soro, outros embrulhados em películas de alumínio a receber tratamentos. Eram centenas de marquesas. Os dois atletas que acabaram a seguir a mim foram transportados de maca. Eu só parei na tenda da comida para “enfiar” 2 sandes de queijo e presunto, tal era a fome…
Faltava saber da minha “princesa”.
Fiquei no final da recta para a meta durante algum tempo e de repente lá vejo o sorriso da Susana com os braços no ar a festejar. Dei-lhe a bandeira para a mão e continuei a vê-la correr em direcção à meta aos saltos. A emoção era muita. Era um sonho que tínhamos conseguido realizar e era o culminar de 1 ano de algumas privações e sacrifícios.
No dia seguinte, tal e qual os criminosos que voltam ao local do crime, nós passamos novamente pelo local da meta para voltarmos a recordar as emoções e para a foto da praxe.