Havia Festa no Porto e Eu Não Sabia
Havia Festa no Porto e Eu Não Sabia
{xtypo_dropcap}C{/xtypo_dropcap}hamo-me António Fonseca, nasci no Porto há 65 anos onde sempre vivi. A minha casa só tem duas janelas, mas são as melhores do mundo. De uma vejo o Douro a terminar o seu curso nas ondas do Atlântico, da outra vejo os jardins do Palácio de Cristal, fonte de inspiração e pequeno pulmão da minha cidade.
No domingo passado vim, como sempre, comprar o meu jornal e tomar o meu cimbalino. Eram 8 da manhã, o tempo estava ameno e não chuvia. Parecia um domingo normal até eu começar a ouvir música, muita gente com roupas desportivas, todas elas muito irrequietas, algumas eu diria até nervosas. O que se iria aqui passar?
Não tardou muito até me aperceber que se iria ali realizar uma prova de atletismo. Há muito tempo que eu não via uma prova ao vivo e à falta de melhor, fiquei por ali a observar. Comecei a aperceber-me que as provas já não eram como no meu tempo. Aqui tudo estava organizado, com barreiras, casas de banho portáteis, chã, café, um camião para transportar as roupas dos atletas até à chegada, não me parecia faltar nada.
Mas o que me estava mais a chamar à atenção eram as pessoas de diversas idades que se preparavam para dali partirem quando fossem 9 horas. Novos e velhos, com carrinhos de bebés, com os seus cães de estimação, vi que nada os faria ficar em casa nesse dia, mesmo com o tempo a ameaçar chuva. E lá foi toda aquela gente pela Júlio Dinis acima, eram cerca de 7.000 dizia a organização em tom de vitória.
Apanhei um papel do chão e comecei a ver pormenores acerca do que se estava ali a passar. Nos 2 dias anteriores tinha havido uma tal de expo-maratona onde os atletas levantavam os seus dorsais e onde poderiam almoçar no sábado. Por isso é que eu vi tanta gente a entrar e a saír, de mochilas azuis às costas, no dia anterior.
A prova raínha era a maratona, mas havia outras duas, uma de 14 Km e outra de 6 para os menos afoitos. Quando vi 42 Km não me apercebi bem o que seria aquilo, mas quando vi o trajecto nem queria acreditar que havia cerca de 1000 pessoas que iriam descer a avenida da Boavista, fazer a marginal toda, ir à Afurada, regressar à Ponte D. Luiz, ir ao Freixo e fazer o trajecto contrário e regressar até ao Parque da Cidade. Eu nem queria crer, esta gente é maluca?
Fiquei absorvido por aquilo, fui a casa buscar o carro e pus-me a caminho da marginal. Quando lá cheguei ainda fiquei mais espantado. Eram pessoas a correr, eram bandas a tocar, só não havia o que eu acho que deveria haver: pessoas a assistir aquele espectáculo que eu estava a achar deslumbrante.
Comecei a diferenciar as pessoas que íam na prova dos 14 Km e na maratona, os que iam na prova mais longa, tinham o nome no dorsal. Foi aí que eu vi que eram muitos os estrangeiros, ouvi falar em mais de 20 países representados. Comecei a apoia-los dizendo o nome deles em voz alta. Eles ficavam radiantes. Mas o que mais me surpreendeu era ver pessoas da minha idade e até mais velhas a correr a maratona. Como era aquilo possível? E o mais incrível é que a maioria deles tinham aspecto de que já teriam feito muitas provas desta distância.
Era já quase hora de almoço e regressei a casa com a satisfação de uma manhã bem passada. Uma manhã a ver gente a fazer o gosta, procurando saúde, correndo mesmo atrás dela. Gente que faz a festa, participa nela e põe a cidade a mexer. Gente que vê as provas apenas como um convívio e que a classificação nada lhes diz.
O Porto estava em festa e eu não sabia. Fiquei com a sensação de que ver não chega. Este ano estive a ver, no próximo ano vou querer participar.
A personagem e a história acima descrita são pura ficção, mas a referida prova é verdadeira e é a melhor Maratona de Portugal.
Autor: Victor Dias in www.correrporprazer.com